(Texto feito para a discilpina de Edição)
Good Copy Bad Copy (Dinamarca, 2007) é um documentário atípico. Em primeiro lugar, ele não foi oficialmente exibido em nenhuma sala de cinema. E, ao mesmo tempo, já foi visto por pessoas em todo o mundo. Como conseguiu essa façanha? Qualquer um que já tenha feito algum download sabe como é possível. Isso acontece até com blockbusters. Por que um filme independente não seria ilegalmente compartilhado pela internet? Caso seja esse seu pensamento, preciso, infelizmente, desapontá-lo. Good Copy é distribuído legalmente, de graça e com incentivo do seu próprio criador.
No site oficial (goodcopybadcopy.net), há um link para download p2p (peer-to-peer). Em bom português, isso significa que você pode baixar o filme através de um programa de compartilhamento. Não pense que você nunca ouviu falar disso. É só lembrar do Napster, software muito famoso (e perseguido pela indústria fonográfica) no início dos anos 2000. O finado Napster permitia a troca de músicas entre internautas. Essa é a característica do p2p: todo mundo que participa pode compartilhar seus arquivos (mp3, filmes, fotos) diretamente com outros usuários.
O p2p funciona como uma rede descentralizada, como se você trocasse CDs com seus amigos ao invés de ir a uma loja de discos. É justamente a troca de arquivos, suas possibilidades culturais e seus empecilhos legais o foco central de Good Copy. Para trazer à tona essa discussão, o filme mostra entrevistas com pessoas de diferentes partes do mundo e com os mais diversos posicionamentos. Entre os entrevistados estão desde produtores brasileiros de tecnobrega até representantes de grandes empresas, como a Bridgeport, detentora de autorais de músicas nos Estados Unidos,
A escolha desses partipantes não é ingênua e cada ambiente é carregado de sentido. Um bom exemplo disso é a fala do professor Ronaldo Lemos, da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro. À primeira vista, ele está em um local totalmente inusitado: eis o professor, numa fábrica de cerveja e com um copo cheio de chopp na mão. Isso, claro, não é uma homenagem ao “malandro carioca”, mas uma referência à frase do fundador do Software Livre, Richard M. Stallman: “Free software é uma questão de liberdade, não de preço. Para entender o conceito, você deve pensar em free como aparece em free speech (liberdade de expressão), não como em ‘free beer’ (cerveja liberada)“.
Outra construção extremamente inteligente é a fala de Dan Glickman, CEO da Motion Picture Association of America (MPAA), representante das maiores companhias cinematográficas dos Estados Unidos. O CEO é um dos maiores lobbistas de Washington, mas essa característica é apenas sutilmente insinuada quando se mostra seu escritório, cheio de fotos com presidentes e políticos americanos. A fala de Glickman é seguida por entrevistas com um vendedor de DVDs piratas na Rússia e, por fim, com Anakata e Tiamo, administradores do site sueco Pirate Bay, uma biblioteca de links para downloads p2p.
Ao se intercalar falas diferentes, consegue-se ter uma panorâmica das diversas formas de trocas de arquivos e como elas funcionam em diferente países. Mais do que isso, fica claro como as autoridades americanas interferem internacionalmente e como se resiste a essa interferência mundo afora. Se, na Rússia, o caminho para isso tendeu à total ilegalidade (com envolvimento até mesmo da polícia local), na Suécia, os defensores das trocas livre fundaram um partido político, o Partido Pirata, que já possui até mesmo representantes no Congresso sueco.
É esse o grande trunfo de Good Copy: poder trazer a um público mais amplo temas que só são conhecidos por especialistas e militantes da chamada “cultura livre”. Você sabia que a Nigéria é o país no mundo que mais produz filmes? E que um dos CDs de maior sucesso nos Estados Unidos em 2005 foi feito pelo DJ Danger Mouse e foi distribuído gratuitamente pela internet? Essas curiosas histórias são o verdadeiro atrativo do vídeo. Se você vir o documentário e for curioso o suficiente, vai correr atrás de cada uma das referências.